quarta-feira, 4 de abril de 2012

Journey


Sem os motores gráficos, outputs HD e processadores de quatro núcleos de hoje em dia, os velhos jogos da era do NES e doMega Drive dependiam muito menos de qualidades cinematográficas de jogos contemporâneos: eles tinham a ingrata necessidade de vender o que basicamente era “o jogo”- pouca história ou beleza visual exigia um conjunto de regras e objetivos que pudessem sozinhos alimentar a curiosidade do jogador.
O próprio movimento do avatar na tela era uma das maneiras de cativar o gamer das antigas, e foi o que tornou o primeiro StriderSuper Mario Bros. 3 e Sonic the Hedgehog jogos inesquecíveis (que esses três games tenham levado o nome de seus respectivos protagonistas é de fato uma coincidência feliz, não é?). Journey, o mais novo título dathatgamecompany, parece se inspirar nesta simplicidade pré-Solid Snake que fez a fama de Mario, Sonic e outros, e apresenta algo bem diferente e, arriscamos dizer, imperdível.
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Sim. Journey é o game mais convencional da empresa – a mesma que criou os conceituaisflOw e Flower – mas faz pouco esforço em trazer algo mais complicado do que um jogo sobre pular e andar. No game você controla um misterioso andarilho, que tem como missão cruzar um deserto e chegar ao topo de uma montanha mística. O jogo inclui poucas adições no repertório do personagem – é possível pular mais alto e mais longe conforme você aumenta o comprimento do cachecol do protagonista e “chamados” são usados para ativar itens e mecanismos do cenário. O que torna Journey interessante não é o que ele adiciona, mas como ele varia sem complicar as coisas.
A primeira parte do jogo lembra bastante Flower: é preciso cruzar um dócil e amplo deserto ativando passagens na ordem que bem desejar e resgatando pedaços de pano e sinais brilhantes (que servem para melhorar seus saltos). Mas não demora até que você precise cruzar dunas gigantescas deslizando em alta velocidade ou se veja decidindo com cautela seu caminho enquanto abismos e criaturas mecânicas limitam se movimento. A penúltima fase é praticamente um survival horror em que a liberdade inicial encontra desafio em um ambiente hostil, e o jogo termina com a mais energética e bela última fase que já tivemos o prazer de aproveitar desde Bangai-O: Spirits! Tudo, vale dizer, sem tutoriais nem indicadores obrigando o jogador a seguir uma rota pré-determinada. Simplicidade é de fato uma qualidade emJourney.
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Mas em inserir um avatar móvel, vivo e – mais importante – humanóide em seu precioso jardim chinês, Journey se vê às voltas com um problema bem curioso: contexto. E não é apenas questão da história – que tenta sem sucesso encapsular a saga de uma civilização morta na jornada repetitiva de seu herói.
O problema é que quase não há herói. Aí vai um exemplo: apesar de amplo, o deserto do game é bem delimitado. Ao invés de inserir uma animação do andarilho voltando seu movimento obstinadamente em direção ao seu objetivo (uma solução adotada por muitos jogos), as paredes invisíveis do jogo são convenientes tempestades de areia que empurram o personagem e evitam o progresso. O “herói” se limita a sua jornada não pela sua própria vontade, mas pela do jogo. Funcionava quando você controlava o vento em Flower ou uma impessoal bactéria em flOw, não aqui. Pode parecer um problema mínimo, mas em Journey, a falta de resposta emocional do avatar bota em risco a capacidade de se importar com o belo deserto do título.
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Confie em estranhos
O modo multiplayer, porém, faz um belíssimo trabalho em contornar essa deficiência. Tomando emprestada a abordagem minimalista de Dark SoulsJourney não tem lobbies, voice chat ou lista de amigos. Quando você joga conectado na PSN, jogadores são assimilados automaticamente a seu jogo, e não passam de uma presença discreta que você pode acompanhar ou não. Quando um outro andarilho cruza seu campo de visão (o jogo sabiamente limita um “invasor” por vez) a trama deixa de ser a jornada e passa a ser como você vai lidar com seu companheiro de viagem, uma preocupação que o jogo trata com requintes de mãe – de tal maneira que há um troféu esperando aqueles que passarem 20 segundos juntos sentados imóveis na areia. Até os créditos finais dão espaço especial para o nome dos jogadores que fizeram parte de sua jornada.

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